segunda-feira, dezembro 08, 2008

TREM

Se eu andasse sempre de trem, talvez mais feliz seria
pois nunca a volver, nunca a dar ré, é o modo da trilha
A paisagem sempre de uma vez, nunca repetida
pela imagem do retrovisor, invertida
Talvez mais feliz seria, se eu andasse de trem

Ao passo que o homem-automóvel, que vai de Lisboa à Sintra
terá sempre à disposição a marcha ré.
Verá o que perdeu de relance, por ser homem e possuir pouca fé
nos próprios olhos. Invertido no espelho do retrovisor, já não saberá
se veio de Lisboa ou se vai para Sintra
se seguia para vida ou prosseguia para o mar.

Mas o trem não se irmana a essas coisas. Não desperta o quiçá.
despreza o destino, os avisos de abalroamento
“Se eu casasse com a filha da lavadeira..” e, nesse momento, não estarás mais lá.

Atropela os acorrentados nos trilhos, mães, avós, pianos, segredos, a sala de estar.

Tudo de uma vez, como o vômito sincero da madrugada
Como a liberdade sagrada de uma coisa bruta e grega que não se apieda de ninguém
Eu quero ir como quem se lança a um soco
E o meu coração oco mais feliz seria, se eu andasse de trem