sexta-feira, outubro 21, 2005

Parte 4 (ou, pelo tamanho, 3/76)

No decorrer da noite lenta, o Desembargador foi assombrado na continuidade do seu sono. Assombrado não por fantasma ou súcubo ou espírito desencarnado buscando passar o tempo da eternidade: mas assombrado pelo homem de carne e osso que precedia a titulação; assombrado pelo X do Desembargador. Os suores noturnos denotavam o homem angustiando-se pela oferta sinalizada do papel. Dinheiro para acabar com as preocupações do Desembargador; sim, porque as contas não diferenciam os nomeados dos sem-importância, chegam para todos. E mesmo acordado pelo pânico de saber-se homem naquela hora, o Desembargador sonhou: sonhou com uma casa em praia longe, sonhou com uma viagem para ilha remota, sonhou com a paridade com outros Desembargadores que haviam aceitado outras ofertas de outros advogados em outros processos em outros tempos. E na lentidão das horas, o Desembargador anoiteceu e o homem dentro dele amanheceu. E pela primeira vez em muitos anos, não houve prazer no ato de vestir-se para o café, pois havia um homem dentro dele que desrespeitava a titulação e que acreditava que era mais importante ser homem do que ser Desembargador.