terça-feira, julho 21, 2009

Ao Orecic, com carinho

Foi justamente na mesa de um bar que ouvi a notícia. Justamente no dia do amigo: o Orecic fechou. Assim, inevitável. Cícero bandeou-se para os lados do Rio Grande do Norte, notícias desencontradas da busca por um grande amor. Ou talvez um câncer. Nunca se sabe. A única certeza disso tudo é esse buraco no peito que chora o fim de uma era. No Orecic, eu vivi, praticamente, todas as minhas dores. E todas as alegrias também. Pelo menos até aqui. A notícia do primeiro amor, o anúncio da chegança de Maria Eduarda. A casa feia e desbotada foi testemunha de laços feitos, desfeitos e refeitos, como se fosse um monólito erigido para acompanhar a história íntima de um grupo de homens.
A comida era ruim, o lugar era feio, a cerveja tantas vezes vinha quente. Cícero não nos atendia, tantas vezes. O nosso garçom foi demitido. Mas acima de tudo era aquele nosso quintal, nossa caixa de areia, onde ternos, batas e aventais não entravam;
No início do ano eu compus um frevo chamado “Orecic Futebol Clube” que diz assim em um trecho:

É fevereiro, vem
A carne queima, bem
No Orecic tem uma mesa pra sentar

Esquece o ano, e vem
Vem no meu passo, bem
A vida à toa está na mesa desse bar

O frevo não tem mais sentido, agora. Não tem mais tempo presente. Foi para o reino das coisas idas, como o próprio Orecic, para quem, nessa manhã chuvosa de terça-feira (o anti-dia), eu dedico esse poema:

ORECIC

Eu nunca estarei em paz com a finitude das coisas
porque eu sei que junto com as coisas idas
deixamos de ser esse pouco que nos restava
largados ao vento que sopra o inevitável
deixamos o tênis, os amores, o hálito
a diferença, o choro, o tormento
e tudo fica da espessura de um fotograma na parede
tudo se resume a esse fotograma na parede
nossa tentativa absurda que reter água e areia
como se pudéssemos negociar com a finitude das coisas
e dar-lhe em troca um copo de cerveja
por, quem sabe, mais um segundo de tangência.