Acho que eu sou a primeira pessoa a falar sobre o Mocó. O Mocó é um segredo tão bem escondido que alguns juram que se trata de mais uma lenda urbana. Tratarei deste texto, portanto, como uma dessas fábulas que minha filha consome com os olhos brilhando querendo
em uma vontade tão lúdica que seja a mais pura das verdades.
Dizem que Marcílio de Pádua, chef de cozinha talhado pelas mãos do mundo, depois de tanto andar na contramão da rotação, resolveu aceitar uma paragem e construiu para si um bocadinho de lugar que lhe permitisse alterar a lei do cotidiano. Que lei? A lei que determina as formalidades dos ternos, das gravatas, dos extratos, dos contratos, das notas fiscais. Marcílio deu uma ordem "fiat pax", e tudo aquilo que irrompe como as amarras da modernidade dissolveu-se na entresala do Mocó.
Lá, só existe uma lei: coma como se sua vida existisse para o prazer da gastronomia. Seja um epicurista, pão e vinho. Aceite a cerveja como consequência inasfastável de algo que começou na Suméria há milhares de anos atrás. Coma aquilo que se lhe oferece, cozido a fogo lento, com açúcar, com afeto. Pode ser um joelho de um porco. Pode ser um peixe sob o manto de uma manteiga preta. Pode ser um sarapatel, pode ser um cozido legitimamente madrilenho.
Pode ser tudo que sua imaginação permitir, como nos sonhos.
Onde fica? Perto das terras de São Serapião, no descanso do Cálice Sagrado, à direita da Ilha de Avalon. Talvez fique perto da minha casa, mas sempre encoberto pelo desejo de se mostrar apenas àqueles que carregam na vida a certeza de que a felicidade se mastiga.