(eita mulher prá causar ciúmes...)
Domingou, ensaio geral do Nação
Clara vem com o mundo na palma da mão
vem sorrindo, me dispensa o seu olhar
pois o seu olhar é caro e vale o sem-fim do mar
Quem pensar o amor dessa mulher reter
de carcereiro a prisioneiro vai verter
Clara é a prisão do que você sentir
e dormir com ela é um passo prá se despertar tão só
Clara é sonho e você não vai acordar
Clara é clara e infinita como o mar
Clara diz não choro porque sei ser mulher
mas no fundo o que ela quer é um colo e um solo
prá fincar sua raiz
Descolada, ladra de toda atenção
o seu não tem hierarquia superior
o amor segundo ela é uma contra-mão
e a vida não lhe dá tempo qualquer para uma paixão
Tatuou o seu registro pessoal
bem na nuca (a fronteira entre o bem e o mal)
desesperada, quando chega o carnaval
ela aspira, proibida, e torna a vida como quer
Clara é sonho e você não vai acordar
Clara é clara e infinita como o mar
Clara diz não choro porque sei ser mulher
mas no fundo o que ela quer é um colo e um solo
prá fincar sua raiz
PS (música bobinha, feita aos vinte anos, mas que agrada pelos novos arranjos)
quinta-feira, setembro 22, 2005
Pausa no conto: hoje é equinócio (de primavera)
Para Andréia, que acha meu blog "afrescalhado" : )
A aridez e a flor
Não há primavera nessa terra
por força do clima: ora seco, ora úmido
ora qualquer coisa que entristece a gente
não há uma flor que valha a pena
Mas se naquela menina eu planto esperança
e colho, quem sabe, um olhar de destino
se desatino em prédio, mas sonho com flor
quiçá essa dor, essa ausência floresça
e arremate e me desça ao encontro do chão
Beijando a menina, colhendo-a com calma
Não na palma da mão, ou no canteiro
não por nada, ou por dinheiro que a tenho estação
mas primavera no dia, primavera unção
beijando a menina, colhendo-a com calma
primavera no sim, primavera na alma
A aridez e a flor
Não há primavera nessa terra
por força do clima: ora seco, ora úmido
ora qualquer coisa que entristece a gente
não há uma flor que valha a pena
Mas se naquela menina eu planto esperança
e colho, quem sabe, um olhar de destino
se desatino em prédio, mas sonho com flor
quiçá essa dor, essa ausência floresça
e arremate e me desça ao encontro do chão
Beijando a menina, colhendo-a com calma
Não na palma da mão, ou no canteiro
não por nada, ou por dinheiro que a tenho estação
mas primavera no dia, primavera unção
beijando a menina, colhendo-a com calma
primavera no sim, primavera na alma
quarta-feira, setembro 21, 2005
Segunda Parte
Fantasma (segunda parte)
Anunciado o advogado, esse não se fez de rogado. Sentou-se como se aquele gabinete fosse sua casa e o Desembargador X um amigo do pai ou do avô que lhe pegou nos braços quando em época de calças curtas. Sorria uma lua. Despejava um dicionário. O Desembargador X fez sol na ousadia do advogado que não ousara baixar os olhos ao receber a honra de ser recebido. Encrespou a face franzindo sulcos para mostrar que pública era a função, mas o espaço era privativo. O advogado nem. Disse:
- Desembargador, não vou tomar-lhe o tempo que é precioso. Mas o Senhor tem em mãos um processo muito importante para um cliente meu.
O Desembargador não mudou a face:
- Os autos estão aqui?
- Estão aqui comigo. Pedi à sua assessoria para separa-lo.
- Pois não?
- É um caso delicado. Envolve muito dinheiro.
- Vou ler com cuidado – O Desembargador notou que o advogado ficou nervoso de repente.
- Entenda, Desembargador...há um grande volume de dinheiro envolvido nessa causa. Dinheiro que ajudaria quem precisasse...entende? A liminar...entende?
Não precisava maiores explicações. Pela primeira vez, desde que havia se revestido no gáudio do título que ostentava, o Desembargador X estava presenciando uma oferta de dinheiro pela sua decisão favorável aos interesses de advogado. Não que isso não acontecesse, e até com uma certa freqüência. Mas não imaginava ele que tão cedo no Tribunal recebesse uma proposta indecorosa. Pelo menos aos olhos da lei, da ética, da justiça e de todas essas coisas inúteis que não tangenciam o mundo da vida.
Anunciado o advogado, esse não se fez de rogado. Sentou-se como se aquele gabinete fosse sua casa e o Desembargador X um amigo do pai ou do avô que lhe pegou nos braços quando em época de calças curtas. Sorria uma lua. Despejava um dicionário. O Desembargador X fez sol na ousadia do advogado que não ousara baixar os olhos ao receber a honra de ser recebido. Encrespou a face franzindo sulcos para mostrar que pública era a função, mas o espaço era privativo. O advogado nem. Disse:
- Desembargador, não vou tomar-lhe o tempo que é precioso. Mas o Senhor tem em mãos um processo muito importante para um cliente meu.
O Desembargador não mudou a face:
- Os autos estão aqui?
- Estão aqui comigo. Pedi à sua assessoria para separa-lo.
- Pois não?
- É um caso delicado. Envolve muito dinheiro.
- Vou ler com cuidado – O Desembargador notou que o advogado ficou nervoso de repente.
- Entenda, Desembargador...há um grande volume de dinheiro envolvido nessa causa. Dinheiro que ajudaria quem precisasse...entende? A liminar...entende?
Não precisava maiores explicações. Pela primeira vez, desde que havia se revestido no gáudio do título que ostentava, o Desembargador X estava presenciando uma oferta de dinheiro pela sua decisão favorável aos interesses de advogado. Não que isso não acontecesse, e até com uma certa freqüência. Mas não imaginava ele que tão cedo no Tribunal recebesse uma proposta indecorosa. Pelo menos aos olhos da lei, da ética, da justiça e de todas essas coisas inúteis que não tangenciam o mundo da vida.
terça-feira, setembro 20, 2005
Comecinho do conto
Fantasma
Ser desembargador é exatamente oposto a ser fantasma. Desembargador procura luzes, sol, gente, multidão. Fantasma vive de sombra, medo, de inexistência intuída. Assim era o Desembargador X, gente pública que como seus pares não pertencia mais a si, mas a consciência coletiva de quem o via passar e apontava-o com dedo em riste: “Desembargador X”. E isso lhe comprazia. Dava-lhe a glória cotidiana conquistada a ferro, fogo e política, no garimpo que lhe tomou os últimos anos da titularidade de uma vara comum escondida no fórum da capital.
Esse árduo trabalho de cativar seus superiores justificava (para si) a vaidade diagnosticada no bem-estar de ser apontado no espaço que era seu: o público. Gente privada é diferenciada pelo sobrenome: o “tal” do “fulano”. Sua diferenciação advinha da titularidade outorgada pelo Tribunal de Justiça “Desembargador fulano”, ou, no caso, “Desembargador X”. Até sua família findou-se titularizada: esposa do Desembargador, filhos do Desembargador. E isso também lhe comprazia.
Havia até um certo prazer perverso em vestir a toga, em calcular a altivez do olhar dispensado aos que assistiam ao seu julgamento. Um gozo não liquefeito, mas etéreo como as luzes que eram atraídas pela sua presença emblemática. “Emblemática”: o Desembargador X gostaria disso.
Definitivamente, os fantasmas são diferentes. Contou-me certa vez Josefina Minha Fé que os fantasmas não gostam de pessoas porque lembram a eles que a vida vivida é aquela vivida na carne. Por isso são agressivos com gente viva, quebram louças, rangem dentes, chamam nomes que não lhes eram permitidos chamar quando eram de carne. Mas como ninguém acredita muito em fantasmas, eles vão resignados para o canto mais escuro da casa e evitam o contato direto com aqueles que um dia serão seus pares. Ficam ensimesmados em seu espaço privado, construído no alívio de sua invisibilidade a olhos comuns.
Voltemos, por ora, ao Desembargador X. Seu fim de tarde era sempre sentado no seu gabinete, sala privativa para aliviar as pressões de ser público, tomando um chá de arnica preparado por uma das suas funcionárias mais antigas, uma parenta sua, que tinha a função de filtro: filtrava pessoas de importância das sem-importância quando o Desembargador estava livre para recepções. Filtragem essa não muito eficiente, pois, um dia, apareceu por lá um certo advogado que tinha nas mãos um importante processo, cujo relator era o Desembargador X.
Ser desembargador é exatamente oposto a ser fantasma. Desembargador procura luzes, sol, gente, multidão. Fantasma vive de sombra, medo, de inexistência intuída. Assim era o Desembargador X, gente pública que como seus pares não pertencia mais a si, mas a consciência coletiva de quem o via passar e apontava-o com dedo em riste: “Desembargador X”. E isso lhe comprazia. Dava-lhe a glória cotidiana conquistada a ferro, fogo e política, no garimpo que lhe tomou os últimos anos da titularidade de uma vara comum escondida no fórum da capital.
Esse árduo trabalho de cativar seus superiores justificava (para si) a vaidade diagnosticada no bem-estar de ser apontado no espaço que era seu: o público. Gente privada é diferenciada pelo sobrenome: o “tal” do “fulano”. Sua diferenciação advinha da titularidade outorgada pelo Tribunal de Justiça “Desembargador fulano”, ou, no caso, “Desembargador X”. Até sua família findou-se titularizada: esposa do Desembargador, filhos do Desembargador. E isso também lhe comprazia.
Havia até um certo prazer perverso em vestir a toga, em calcular a altivez do olhar dispensado aos que assistiam ao seu julgamento. Um gozo não liquefeito, mas etéreo como as luzes que eram atraídas pela sua presença emblemática. “Emblemática”: o Desembargador X gostaria disso.
Definitivamente, os fantasmas são diferentes. Contou-me certa vez Josefina Minha Fé que os fantasmas não gostam de pessoas porque lembram a eles que a vida vivida é aquela vivida na carne. Por isso são agressivos com gente viva, quebram louças, rangem dentes, chamam nomes que não lhes eram permitidos chamar quando eram de carne. Mas como ninguém acredita muito em fantasmas, eles vão resignados para o canto mais escuro da casa e evitam o contato direto com aqueles que um dia serão seus pares. Ficam ensimesmados em seu espaço privado, construído no alívio de sua invisibilidade a olhos comuns.
Voltemos, por ora, ao Desembargador X. Seu fim de tarde era sempre sentado no seu gabinete, sala privativa para aliviar as pressões de ser público, tomando um chá de arnica preparado por uma das suas funcionárias mais antigas, uma parenta sua, que tinha a função de filtro: filtrava pessoas de importância das sem-importância quando o Desembargador estava livre para recepções. Filtragem essa não muito eficiente, pois, um dia, apareceu por lá um certo advogado que tinha nas mãos um importante processo, cujo relator era o Desembargador X.
sexta-feira, setembro 09, 2005
E eu canto...
Rosa Negra
Por que será que ele samba
e me deixa bamba assim
e assim, sai varando a madrugada
e me deixa guardada, dentro de mim
Diz que a noite é uma criança
e que o Mundo é seu lar
Diz que não sabe se volta
e nem me pede prá esperar
Por que será que ele samba
e me deixa bamba assim
e assim, sai varando a madrugada
e me deixa guardada, dentro de mim
Diz que a noite é uma criança
e que o Mundo é seu lar
Diz que não sabe se volta
e nem me pede prá esperar
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