quarta-feira, setembro 21, 2005

Segunda Parte

Fantasma (segunda parte)


Anunciado o advogado, esse não se fez de rogado. Sentou-se como se aquele gabinete fosse sua casa e o Desembargador X um amigo do pai ou do avô que lhe pegou nos braços quando em época de calças curtas. Sorria uma lua. Despejava um dicionário. O Desembargador X fez sol na ousadia do advogado que não ousara baixar os olhos ao receber a honra de ser recebido. Encrespou a face franzindo sulcos para mostrar que pública era a função, mas o espaço era privativo. O advogado nem. Disse:
- Desembargador, não vou tomar-lhe o tempo que é precioso. Mas o Senhor tem em mãos um processo muito importante para um cliente meu.
O Desembargador não mudou a face:
- Os autos estão aqui?
- Estão aqui comigo. Pedi à sua assessoria para separa-lo.
- Pois não?
- É um caso delicado. Envolve muito dinheiro.
- Vou ler com cuidado – O Desembargador notou que o advogado ficou nervoso de repente.
- Entenda, Desembargador...há um grande volume de dinheiro envolvido nessa causa. Dinheiro que ajudaria quem precisasse...entende? A liminar...entende?
Não precisava maiores explicações. Pela primeira vez, desde que havia se revestido no gáudio do título que ostentava, o Desembargador X estava presenciando uma oferta de dinheiro pela sua decisão favorável aos interesses de advogado. Não que isso não acontecesse, e até com uma certa freqüência. Mas não imaginava ele que tão cedo no Tribunal recebesse uma proposta indecorosa. Pelo menos aos olhos da lei, da ética, da justiça e de todas essas coisas inúteis que não tangenciam o mundo da vida.