quarta-feira, janeiro 24, 2007

Os poemas de Francisco me deixam melancólico, porque traduzem com lâmina exposta a melancolia que habita nele. Esse é o móvel do poema, transcender o particular e alçar a dor alheia sem se dar conta dela. O poema abaixo lembra um poema que eu fiz em circunstâncias que acredito semelhantes as que levaram Francisco ao cinzel tão contundente. E isso sem que houvesse comunicação explícita, apenas porque ele virou letras.

Por descuido cruzei a fronteira.
Vivo estrangeiro em minha casa.

Bagagem revistada.
Íntimo exposto.
Parte impedida de prosseguir.

O peso dos rancores.
As múltiplas máscaras.
Memórias de amor.

Necessário o catálogo da vida.
O inventário de cada item a abandonar.

E lá se vão pedras e mais pedras.
Passos e mais passos.
Estórias.

E lá se vai insensatez. E espera.
E lá se vai tristeza.

No fim, apenas o indispensável.
O retrato do menino de cabelo de milho,
com sua família centenária.

Punhado de lembranças.
Organizadas por épocas.
Convergentes.

Bagagem revisitada.
Caminho exposto.
Parte regressa, parte prossegue.

O estrangeiro de mim se despede.

Fco.