domingo, janeiro 09, 2011

Sobre o brega e outros bichos

Dentro do contexto social denominado “mundo cultural” ou coisa que o valha há uma supervalorização da música extremamente popular que se convencionou a chamar de “brega”. Basta uma pesquisa rápida sobre novas bandas do mercado musical independente para que se comprove a existência de um viés seguido por novatos e que está sustentado na música feita na periferia das grandes cidades do Norte e do Nordeste.

O grupo social que gosta de se afirmar na contramão da cultura de massa, e por tais razões mais culta que as demais, vem ostentando sua presença em festas realizadas fora das circunscrições geográficas da classe média de uma maneira ideologizada, utilizando não apenas como diversão, mas como provocação.

O questionamento da dicotomia entre a música brega e a chamada MPB já havia sido colocada em xeque desde a década de 70 com Caetano Veloso gravando (e cantando ao vivo no Phono 78) “Eu vou tirar você desse lugar” do Odair José. Posteriormente, Caetando gravou outros cantores tachados de “cafonas”, o adjetivo antecessor do “brega”. Algumas dessas gravações são memoráveis.

Particularmente eu já apresentei minha opinião quando tive a oportunidade de escrever sobre o fenômeno João do Morro (quem tiver curiosidade, ver os comentários http://acertodecontas.blog.br/atualidades/joao-do-morro-um-sambista-de-verdade/).

Gosto bastante de algumas músicas do grupo Calypso e acho “A Vida é Assim” uma música muito bem estruturada, apesar da letra simples e sem pretensão. Qualquer segregação apriorística do que é ou não é arte será sempre o mesmo preconceito que, no início do século XX, recaiu sobre o samba.

O que eu não concordo é o tratamento ideologizado do “brega” e a tentativa de impor qualquer música feita na periferia (geográfica ou cultural) como ponto de resistência à massificação midiática. Para mim, tal atitude esvazia o conteúdo crítico, empobrece o reconhecimento do que é arte popular e desvaloriza a espontaneidade da música que paradoxalmente (e momentaneamente) é louvada.

A boa música se releva por si, independente de posturas guerrilheiras da pseudo-intelectualidade que faz da falta de recursos uma bandeira que se perpetua para legitimar a divisão cultural.

PS – Para fins de fomentar a discussão eu coloco uma versão feita para o novo fenômeno popular “Vou não, posso não”, onde um arranjador preencheu a música com acordes dissonantes não existentes originalmente na música e deu um andamento de bossa nova.
http://www.youtube.com/watch?v=YiPMK6e6bT0&feature=player_embedded

Evidentemente trata-se, aqui, de uma tentativa de demonstrar que qualquer música bem arranjada é boa. O argumento é falacioso por dois motivos: 1) A música tocada é instrumental. A letra é suprimida. 2) A estrutura da música ocidental, desde a Idade Média, segue um padrão de escalas tonais que soa agradavelmente aos ouvidos. De Tom Jobim a DJ Sandro esse padrão é minimamente repetido (não vão sair por aí dizendo que estou a comparar um com o outro). Um arranjo bem feito em cima de acordes seqüenciais sempre vai soar agradavelmente aos ouvidos do auditório. Isso não quer dizer que a música é boa, nem que isso é arte.