quinta-feira, outubro 28, 2004

Geografia da terra seca e do papel

Eu sou adepto da poesia pela pedra. A poesia pensada e perene. Fazer poesia é antes de tudo pensar a poesia; interpretar o que cerca o homem de uma forma poética, mas sem "poetizar o poema". Não consigo exergar poesia na poesia que é fruto da alma derramada em fluxos constantes de amor lírico. Por isso ponho-me de encontro àqueles que exergam o derrame em poetas como Fernando Pessoa, Manuel Bandeira ou mesmo Pablo Neruda. É uma falácia. São todos sapos tanoeiros fazendo e refazendo a linguagem coloquial de maneira pensada, mas sob um verniz de impulso d´alma que aparentemente esconde o processamento do mundo através da reconstrução lingüística.

É preciso mãos de artesão. E isso nem todo mundo tem.

(À Rodrigo, que já havia intuído isso em o
"Verso e o Seco")


Geografia da terra seca e do papel


Teu instrumento é a terra seca, esta que tudo impede
Mas que abre a carne seca para algo, tão mais molhado quanto agreste
Algo que a seca veste, mas não corrompe nem alivia
Algo que faz parte da terra seca e na terra seca busca alforria
Algo que desfaz a terra seca e a mesma terra seca depois principia
Em outra superície seca, porém mais branca do que a que antecedia
O papel essa nova terra seca, onde escrevemos nossa geografia
E o molhamos com nossa veia aberta a terra seca que em nós existia